
Trabalho neste escritório tem alguns anos. Comecei na sala 12, primeiro andar, ainda inseguro, recém-formado. Três anos depois estava já noutra sala, noutro cargo, noutra dimensão. A sala agora é no sexto andar. Curiosamente a sala 62. Alguma numerologia deve explicar a coincidência. A vista que tenho agora da janela é exatamente a mesma de antigamente. Talvez com a diferença da panorâmica, numa altura que me permite ver além da praça XV e do restaurante japonês do outro lado da rua. Dos cinco andares que me separam daquele primeiro emprego - menos responsável e menos burocrático – fica a sensação de nunca ter mudado de janela.
Não que eu fique todo o tempo espiando a vida passar do lado de fora dos meus afazeres diários. Nada disso. É que há coisas que se fazem atentar. Certa rotina nos torna familiar à situação. Quando olho pela janela e vejo as coisas que todos os dias acontecem, sinto-me à vontade com as coisas que todos os dias faço também. Parece que percebemos, nessas horas, as engrenagens do mundo de fato funcionando.
Há coisas, entretanto, que, mesmo fazendo parte da rotina, causam certa estranheza. Estou acostumado à vida daquela praça e das ruas que a contorna. Estou acostumado às pessoas e até à comida do restaurante japonês. Mas há algumas coisas com quais não acostumo.
Todos os dias, aquele homem fica no mesmo lugar. Seu lugar é a praça, chega por volta das dez da manhã e só sai de lá entre duas e três da tarde. Certamente vai tomar seu lanche, vai ao banheiro, vai às compras, não faço a menor ideia do que ele tem a fazer. Sei que ele volta exatamente uma hora depois. Seu expediente vai para além das seis horas da tarde. Quando vou embora, ele ainda está lá. Veste trajes pouco convencionais. Está sempre de chapéu – varia entre um gorro, uma boina e um outro à moda panamá - camisa abotoada, terno. A roupa, pode-se ver, é um pouco desgastada, tem manchas de nódoas pelo casaco, a calça tem a barra desfiada. O sapato marrom não sente o esfregar de uma graxa por muito tempo. De qualquer modo, ele está lá todos os dias. Traz um jornal nas mãos, por vezes algum livro, revista de palavras-cruzadas. Senta-se no mesmo banco. Põe uma caixinha encapada com papel colorido ao seu lado e fica ali, por todo o tempo que já mencionei. O curioso é que há pessoas que passam por ele e deixam-lhe moedas na caixinha. Deixam-lhe notas. Pessoas diversas, mães com crianças, senhores, rapazes, garotas, uma gama de personalidades deposita-lhe a confiança em dinheiro. Pagam com seus ordenados o tempo que aquele homem dedica à praça.
Algumas pessoas transitam a vida de um modo que contraria toda a expectativa de a engrenagem continuar seu ciclo, sua rotina, seu movimento. Imagino-o chegando em sua casa, comentando com usa família sobre o dia que tivera, sobre as coisas que lera, sobre a praça, que é seu ambiente de trabalho. Imagino-o sozinho, chegando em algum albergue, em algum asilo, em qualquer lugar. Imagino-o deitando sua cabeça no travesseiro e sentindo-se tão trabalhador quanto qualquer um de nós.
Não que eu fique todo o tempo espiando a vida passar do lado de fora dos meus afazeres diários. Nada disso. É que há coisas que se fazem atentar. Certa rotina nos torna familiar à situação. Quando olho pela janela e vejo as coisas que todos os dias acontecem, sinto-me à vontade com as coisas que todos os dias faço também. Parece que percebemos, nessas horas, as engrenagens do mundo de fato funcionando.
Há coisas, entretanto, que, mesmo fazendo parte da rotina, causam certa estranheza. Estou acostumado à vida daquela praça e das ruas que a contorna. Estou acostumado às pessoas e até à comida do restaurante japonês. Mas há algumas coisas com quais não acostumo.
Todos os dias, aquele homem fica no mesmo lugar. Seu lugar é a praça, chega por volta das dez da manhã e só sai de lá entre duas e três da tarde. Certamente vai tomar seu lanche, vai ao banheiro, vai às compras, não faço a menor ideia do que ele tem a fazer. Sei que ele volta exatamente uma hora depois. Seu expediente vai para além das seis horas da tarde. Quando vou embora, ele ainda está lá. Veste trajes pouco convencionais. Está sempre de chapéu – varia entre um gorro, uma boina e um outro à moda panamá - camisa abotoada, terno. A roupa, pode-se ver, é um pouco desgastada, tem manchas de nódoas pelo casaco, a calça tem a barra desfiada. O sapato marrom não sente o esfregar de uma graxa por muito tempo. De qualquer modo, ele está lá todos os dias. Traz um jornal nas mãos, por vezes algum livro, revista de palavras-cruzadas. Senta-se no mesmo banco. Põe uma caixinha encapada com papel colorido ao seu lado e fica ali, por todo o tempo que já mencionei. O curioso é que há pessoas que passam por ele e deixam-lhe moedas na caixinha. Deixam-lhe notas. Pessoas diversas, mães com crianças, senhores, rapazes, garotas, uma gama de personalidades deposita-lhe a confiança em dinheiro. Pagam com seus ordenados o tempo que aquele homem dedica à praça.
Algumas pessoas transitam a vida de um modo que contraria toda a expectativa de a engrenagem continuar seu ciclo, sua rotina, seu movimento. Imagino-o chegando em sua casa, comentando com usa família sobre o dia que tivera, sobre as coisas que lera, sobre a praça, que é seu ambiente de trabalho. Imagino-o sozinho, chegando em algum albergue, em algum asilo, em qualquer lugar. Imagino-o deitando sua cabeça no travesseiro e sentindo-se tão trabalhador quanto qualquer um de nós.
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